Um até logo à campanha #VisibleWikiWomen: histórias e reflexões

29 julho 2021

A campanha #VisibleWikiWomen 2021 chegou ao fim. Em quase três meses de campanha, junto a nossa/s parceiras/parceiros/parceires e comunidades, encaramos um caminho cheio de desafios, mas também cheio de criatividade e genialidade coletiva e feminista, além de imagens fantásticas de mulheres, pessoas trans e não-binárias ao redor do mundo. 

A pandemia da Covid-19 impactou a todas nós, assim como nossas parcerias, comunidades, e até mesmo a #VisibleWikiWomen, de muitas maneiras. Em especial, a pandemia afetou os uploads em massa feitos por galerias, bibliotecas, arquivos e museus, e por nossas parceiras vinculadas à Wikimedia. Também comprometeu a participação de muitas comunidades, particularmente as do Sul Global, que seguem sendo desproporcionalmente afetadas pela crise. 

Esta realidade desafiadora, alarmante, e muitas vezes exaustiva exigiu de nós e de nossas comunidades muita criatividade e resiliência. Nós confiamos na sabedoria feminista de nossas amigas e parceiras da Association for Women’s Rights in Development (AWID) para escolher um tema que nos encorajasse e inspirasse. O tema teve como foco a celebração de mulheres, pessoas trans e não-binárias que criam realidades feministas e são exemplos de resistência, questionando sistemas de poder e privilégio, e lutando pela liberdade e justiça para todes. 

Como resultado da campanha #VisibleWikiWomen 2021, trouxemos mais de 1700 imagens para a Wikimedia Commons, que agora ilustram páginas em 38 idiomas da Wikipédia. Estes números, entretanto, não contam toda a história desta edição; na verdade, não há ninguém melhor do que as próprias participantes para compartilhar o que a #VisibleWikiWomen significou para elas e suas comunidades. Nós convidamos você, a se inspirar e aprender com as reflexões trazidas por essas mulheres, que co-criaram e continuam criando suas realidades feministas mesmo diante de uma pandemia. 

#VisibleWikiWomen 2021 na voz de cinco ativistas que lutam pela visibilidade das mulheres 

Apresentamos as histórias e detalhes da campanha #VisibleWikiWomen 2021 através dos relatos de Catalina Gutierrez, Justina Aina, Modak Basudha, Ruby Damenshie-Brown, e Selva Mustafa.

Consultora independente em gênero e sustentabilidade na República Dominicana. Catalina Gutierrez trabalha com organizações governamentais, multilaterais, do setor privado e da academia, assim como com as Nações Unidas, para promover a igualdade de gênero.

Mulher britânica-nigeriana, a atriz, vocalista, poeta e produtora Justina Aina inspira-se na possibilidade de mergulhar em histórias que são inimitavelmente novas ou reintroduções a trabalhos que deveriam ter recebido muito mais louros, na internet e fora dela.

Engenheira de profissão e educadora por paixão na África do Sul, Modak Basudha trabalha para construir uma comunidade de mulheres cujas histórias são ouvidas e reconhecidas. Ela é ativista por uma sociedade progressista, em que todas as vozes são ouvidas e reconhecidas.

Ativista de gênero e apaixonada pela educação e conhecimento aberto, Ruby Damenshie-Brown trabalha na Open Foundation West Africa (OFWA), onde promove acesso aberto na educação por meio de diferentes iniciativas em Gana, seu país de origem.

Integrante do grupo Elephants Trail (patrocinado pela Fundação Lankelly Chase) e hematologista de profissão. Como pessoa marginalizada na região da Grande Manchester, no Reino Unido, Selva Mustafa é apaixonada por fazer mais vozes serem ouvidas, para que mais pessoas possam viver vidas gratificantes em ambientes de trabalho saudáveis.

Trazendo ao centro as comunidades do Sul Global para aumentar a visibilidade de mulheres online 

Motivadas pelo tema da campanha que nos inspira criar nossas próprias realidades feministas, fizemos um esforço extra para trazer ao centro da #VisibleWikiWomen 2021 as comunidades do Sul Global, em especial as que estão localizadas no continente africano. Contratamos nossa primeira coordenadora na África, Pamela Ofori-Boateng, para dar apoio às nossas parceiras africanas e para ampliar nossa rede de participantes no continente durante a campanha. Como resultado, observamos um aumento no número de imagens que retratam mulheres africanas na campanha, em comparação às edições de anos anteriores


Também apoiamos iniciativas de aprendizado coletivo, liderando e co-liderando oficinas sobre como fazer upload de imagens na Wikimedia Commons. Nós co-organizamos duas oficinas online com nossas parceiras AWID e World Pulse, ambas redes feministas internacionais, e facilitamos uma série de workshops para hackear narrativas e entender o que é a justiça do conhecimento como parte do projeto piloto Greater Manchester Narratives Lab, patrocinado pela Fundação Lankelly Chase. 

Oficina da #VisibleWikiWomen feita junto à comunidade AWID

A maioria das participantes nunca havia feito upload de uma imagem sequer na Wikimedia Commons, e muitas nunca haviam ouvido falar do movimento Wikimedia e seus esforços pelo conhecimento aberto. Portanto, todas as etapas do processo eram novidade para elas. Catalina Gutierrez explica que discutiu em detalhes, junto às colegas, qual seria a melhor descrição para uma imagem, em inglês e em espanhol. “Uma vez que fizemos o upload, procuramos a imagem na internet e ela apareceu no mecanismo de buscas. Foi um momento feliz para todas nós,” disse ela. 

Pela primeira vez este ano, nós testamos a ideia piloto de oferecer recursos financeiros e técnicos diretamente às organizadoras locais da campanha, além dos recursos de conteúdo que compartilhamos desde a primeira edição da #VisibleWikiWomen. Ao fim da campanha, as organizadoras haviam realizado seis eventos online a nível nacional: quatro na África (Gana, Quênia, Ruanda e Tanzânia), e dois na América Latina (Argentina e Uruguai). Além de aumentar e melhorar a capacitação e habilidades técnicas, esses eventos e oficinas serviram como oportunidades de refletir sobre desigualdades de gênero na Wikipédia e seus impactos na internet como um todo para essas comunidades. Durante as oficinas online, integrantes se engajavam de maneira entusiasmada durante as sessões de treinamento simultâneas oferecidas durante o workshop:

“Um dos principais aprendizados técnicos do workshop foi a habilidade da Whose Knowledge? de comunicar sobre esse problema ou lacuna e como a campanha tenta combatê-lo, ao oferecer capacitação e experiência prática às participantes, que fazem upload das próprias imagens na Wikimedia Commons. Ter salas de treinamento simultâneas menores para facilitar o processo garantiu que todas as integrantes recebessem o apoio necessário. Isso é fundamental e algo que vou incorporar às oficinas que realizar no futuro.”

— Ruby Brown

O nível de energia com o qual as participantes se juntavam às atividades dá um exemplo da importância dessas iniciativas em prol da visibilidade das mulheres e outras identidades marginalizadas. “É a minha missão de vida garantir que mais mulheres sejam ouvidas e que mais de nós estejam em cargos de decisão em todos os comitês a nível global”, disse Modak Basudha, da World Pulse. 

Como mais um dos efeitos perversos das desigualdades, os espaços online como a Wikipédia perpetuam gap de gênero em seus conteúdos. Cerca de 20% das biografias no site — que continua a ser um dos mais acessados da internet — representam mulheres, e a porcentagem das biografias que contam com imagens é ainda menor. Essa desigualdade de gênero na Wikipédia também vai além da sub-representação e falta de visibilidade das mulheres nos conteúdos. Homens brancos, em especial vindos de países da Europa e da América do Norte, são maioria entre os contribuidores da Wikipédia, e apenas 10% das pessoas que editam páginas da Wiki se identificam como mulheres.

#VisibleWikiWomen se opõe a tais formas de injustiça epistêmica, por meio das quais as contribuições feitas por mulheres permanecem negligenciadas e os conhecimentos de comunidades marginalizadas, ignorados. Ruby Brown elogiou a iniciativa por oferecer uma resposta a esse gap de gênero: “[Isso] empodera muitas mulheres ao redor do mundo a ajudar a avançar nesta agenda e melhorar as narrativas,” disse ela, depois de participar de uma oficina organizada pela World Pulse em parceria com a Whose Knowledge?. “A campanha encoraja mulheres a terem um papel ativo e serem protagonistas da História, criando uma representação mais correta das suas ações por meio de textos e imagens,” disse Catalina Gutierrez, que participou do mesmo evento.

Depois de participar da oficina Greater Manchester Narratives Lab, Justina Aina afirmou:

“Ter as histórias [de mulheres] representadas e links para aprofundar o conhecimento [sobre seus feitos] é tão importante pois, na maioria das vezes, as mulheres não narram suas próprias trajetórias. Também é uma forma de assegurar que melhorias e provocações que acontecem na sociedade possam ser traçados até suas fontes e de que as pessoas possam ter mais controles sobre suas narrativas”.

Workshop da #VisibleWikiWomen com a comunidade da World Pulse 

Superando desafios e aprendendo juntas

No nosso segundo ano de campanha em meio à Covid-19, nossas comunidades, parceiras e aliadas ainda sofriam as consequências graves da pandemia, como apontado por Modak Basudha. “As regulações aqui diminuíram meu contato físico com outras pessoas, mas ainda assim o trabalho continua, mesmo que a passos lentos. E continuarei eternamente grata pelas oficinas que guiaram a  visão que eu já tinha.” Novas explosões de casos e variantes do vírus surgiram, aumentando as desigualdades entre o Sul e o Norte Global em termos de acesso à saúde, às vacinas, ao apoio econômico e social, e à ajuda internacional. Em meio a tais circunstâncias, foi difícil para muitas integrantes das nossas redes manter a energia e o tempo de dedicação necessário para organizar a campanha a nível local. 

Apesar disso, muitas deram seus primeiros passos ao editar conteúdos da Wikimedia Commons durante oficinas da #VisibleWikiWomen, e outras ficaram fascinadas pelas possibilidades de produção e colaboração nas plataformas. 

“A lição principal das sessões, para mim, foi de que a Wikipédia é mais colaborativa e perspicaz do que me fizeram acreditar”

— Justina Aina

“Um aprendizado técnico que tive foi o de como fazer edições na Wikimedia Commons. Nunca havia ouvido falar da Wikimedia Commons e agora sei como funciona. Eu tenho uma percepção completamente diferente da Wikipédia. Antes, eu imaginava que tudo podia ser editado sem qualquer forma de averiguação, e agora sei que não.”

— Selva Mustafa

Como resultado direto da #VisibleWikiWomen, mais de 40 editoras se uniram à comunidade Wiki e nós esperamos que mais continuem a se interessar pela campanha. Participantes pensam em compartilhar esses ensinamentos com suas comunidades, como conta Selva Mustafa. “Eu vou compartilhar o que aprendi com meus colegas porque esse tipo de coisa precisa ser compartilhada e porque elas são candidatas ideais para se juntar a tais esforços.”

Nossas esperanças e sonhos para a #VisibleWikiWomen 2022

No próximo ano, pretendemos expandir o apoio que damos às lideranças de nossas parceiras e comunidades, para que organizem seus próximos eventos da #VisibleWikiWomen, em especial para criar recursos multimídia em mais idiomas para a campanha. 

Queremos construir mais parcerias com redes feministas, assim como galerias, bibliotecas, arquivos e museus no Sul Global, para criar espaços seguros e alegres em que mais mulheres e pessoas trans e não-binárias aprendam sobre o wikiverso e reflitam sobre justiça epistêmica e desigualdades de gênero na Wikipédia. 

Como disse Justina Aina, ao ser perguntada sobre como se sentiu ao participar da campanha:

“Isso faz com que eu me sinta esperançosa sobre o crescimento nos números de mulheres na Wikipédia e na internet como um todo”.

Nós, também, nos sentimos esperançosas por um futuro em que mulheres, pessoas trans e não-binárias sejam visíveis, celebradas e  representadas de forma justa na internet. Agradecemos imensamente a cada participante, cada parceria e a cada comunidade que se juntaram a nós neste ano, em mais um passo em direção a esse futuro que estamos co-criando juntas.

Tradução por Priscila Bellini, com revisão de Adele Vrana.

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